A literatura é um dos meios de compreender a grandiosidade do 20 de novembro a partir de obras de autores negros e negras sobre a luta da população negra por direitos e a cultura afro-brasileira
Texto: Juca Guimarães I Edição: Nataly Simões | Imagem: Reprodução/Quilombhoje
Um livro é muito mais do que um amigo. Ele te abre a janela para o mundo e outra para dentro de você mesmo. Ao pensar na negritude e em todas as questões que envolvem o Dia da Consciência Negra, que representa a luta do povo negro por liberdade e diginidade, eu sempre me apoio no conteúdo de livros escritos por autores que me acompanham ao longa da vida.
São livros que, cada um ao seu modo, me fizeram melhorar como pessoa e como jornalista. Separei cinco indicações nesta lista, mas existem muitas outras obras que eu acredito que você também tenha em casa e que abordam a questão da negritude. Caso não tenha, a minha dica é que comece a ler sobre o assunto.
1. “Quarto de Despejo”, Carolina Maria de Jesus
É a narrativa mais impactante e profunda sobre as condições precárias das relações sociais que sobraram no país pós-abolição e como o racismo bloqueia talentos e apaga a memória cultural da nação, condenando todos a um eterno looping de atraso. Carolina Maria de Jesus escreveu tudo o que viu e sentiu. Seus relatos são brutais e tocantes. Ela dizia que a favela era o quarto de despejo da cidade. Esse livro é sobre isso e muito mais. Assim como o genial Lima Barreto, Carolina captou o sentimento e as dores de um povo.
2. “Becos da Memória”, Conceição Evaristo
É um enorme prazer ler a Conceição Evaristo. Ela nos apresenta com talento e simpatia seus personagens cheios de histórias e experiências. A vida pulsa e luta na literatura dessa autora, que com coragem e energia vai nos contando memórias. Creio que sejam histórias e lembranças familiares para os negros que viveram nas décadas de 70 e 80, sobretudo as mulheres negras. Tempos de muito racismo, preconceitos e privações veladas, tais quais as que vivemos hoje.
3. “Quilombismo”, Abdias do Nascimento
O ativista Abdias do Nascimento foi inspirado pelos orixás para viver ao extremo, incansavelmente, a luta contra o racismo no Brasil. Fez de tudo um pouco, política, teatro, artes plásticas, protesto, romances, poesias, enfim, não teve um campo de batalha onde ele não levantou a voz em defesa do povo negro. Fez por convicção da importância da luta. Em “Quilombismo”, cujo subtítulo é “Documentos de uma luta pan-africanista” está registrado uma parte dessa bela história de um intelectual brilhante que nunca deu trégua ou fez concessão ao racismo.
4. “Racismo Estrutural”, Silvio Almeida
A lei áurea, de 13 de maio de 1888, que encerra o período de escravidão no Brasil, é composta por dois artigos, o primeiro onde está decretado o fim da bárbarie do cativeiro tem apenas 12 palavras. Dá para ler na íntegra nos registros do governo (aqui). O que a lei não diz e isso muda toda a história do país é como o racismo se institucionalizou e se estruturou em terras brasileiras. Essas respostas tão importantes, além de outras reflexões igualmente importantes, estão no livro do jurista e filósofo Silvio Almeida. O texto é exemplar e didático. Fala abertamente e com profundidade de exemplos sobre os impactos e a origem do racismo estrutural. Como foram criadas as relações de poder na política, na sociedade e na economia. O livro traz também uma ótima bibliografia para incentivar novas leituras e reflexões.
Alguns livros da biblioteca do jornalista Juca Guimarães. Foto: Acervo/Pessoal
5. “Coleção Cadernos Negros”, Vários autores
Não é só uma coleção. Se trata da série de publicações regulares mais antiga do Brasil e um marco na luta de resistência de autoras e autores negras e negros. Editado pela Quilombhoje, a coleção chegou em 2019 no volume 42. O primeiro é de 1978. Os números pares são de contos e os ímpares de poesias. A seleção dos autores de cada volume é feita por uma comissão que avalia o texto sem saber quem foi que escreveu, dando chance para que a cada ano se apresentem novos e talentosos autores. Os “Cadernos Negros” reunem a produção literária de autores negros de todas as regiões do país e de diversas épocas. Os livros registram o frescor, a angústia, o orgulho e o cotidiano dos seus autores, seja em prosa ou poesia. Em 2020, será lançado o volume 43.
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